PARTE I A História, A Inquisição

 Pedro Berruguete: São Domingos Presidindo a um auto da fé (1475).
Visões artísticas que retratam o tema geralmente apresentam cenas de tortura e
de pessoas queimando na fogueira durante os eventos/procedimentos, o que não
corresponde á realidade histórica - as penas eram em geral cumpridas noutro
local, por vezes noutro dia.

     “De 1503 a 1530 milhares de “cristãos-novos” vieram para o Brasil auxiliar na colonização. Mas a alegria do descobrimento não durou muito, pois em 1531, Portugal obteve de Roma a indicação de um Inquisidor Oficial para o Reino, e em 1540, Lisboa promulgou seu primeiro Auto-de-fé. Daí em diante o Brasil passou a ser terra de exílio, para onde eram transportados todos os réus de crimes comuns, bem como judaizantes, ou seja, aqueles que se diziam aparentemente cristãos-novos, porém, continuavam em secreto a professar a fé judaica. (cripto-judeus). 

De uma simples terra de exílio a situação evoluiu e o Brasil passou a ser visto como colônia. Em 1591 um oficial da Inquisição foi designado para a Bahia, então capital do Brasil. Não demorou muito, já em 1624, a Santa Inquisição de Lisboa processava pela primeira vez contra 25 judeus brasileiros (os nomes foram extraídos dos arquivos da Inquisição da Torre do Tombo, em Lisboa).” E é nesta lista que encontramos o nome do Duodecavô de Antônio (João de Sousa Pereira), poderão ver a história sobre ele e a lista dos nomes, na Parte II , Capítulo V, em  Duodecavós.

Outros acreditam que o próprio Cristóvão Colombo era judeu e que ao “descobrir” as Américas em 12 de outubro de 1492, levou muitos judeus fugidos na embarcação, que por coincidência, foi no mesmo ano da criação da lei espanhola contra os judeus, que foi em 31 de março de 1492.

Assim, para que a religião judaica continuasse a ser passada às novas gerações, as mulheres eram incumbidas de ensinar aos filhos. Deste modo, não só as práticas religiosas como também o papel da mulher dentro do judaísmo sofreram modificações. 

Anteriormente, as funções mais importantes da religião eram atribuídas aos homens. No entanto, após a entrada da doutrina hebraica na ilegalidade, as mulheres acabaram assumindo este papel, se tornando as principais fontes de resistência e disseminadoras dos ideais disfarçados, ajudando, assim, na reestruturação do judaísmo na época inquisitorial.

    Segundo Anita Novinsky, citada por Assis: "(...) A casa foi o lugar do culto, a casa tornou-se o próprio Templo. No Brasil colonial, como em Portugal, somente em casa os homens podiam ser judeus. Eram cristãos para o mundo e judeus em casa. Isso teria sido impossível sem a participação da mulher. (...) mulheres cristãs-novas apresentaram no Brasil uma resistência passiva e deliberada ao catolicismo. Foram prosélitas; recebiam e transmitiam as mensagens orais e influenciavam as gerações mais novas".

Um exemplo de uma destas mulheres, foi Maria da Costa, filha de João Lopes de Elvas (que já citei anteriormente) que foi perseguida por praticar o criptojudaísmo em Portugal, foi presa e torturada por 6 anos. Maria da Costa foi marcada em seu processo inquisitório como “judaizante”.

     As principais formas de punição eram os castigos físicos - as galés, trabalhos forçados, açoitamentos, por exemplo -, as penas espirituais, os degredos, os confiscos e, em último caso, a pena de morte pelo fogo ou pelo garrote.

      Assim, com a prisão, iniciava-se a punição e seguia quase sempre à condenação. Como essa punição estava ligada necessariamente ao sequestro (pois sequestravam as pessoas e todos os seus bens). Em relação aos confiscos, partia-se de uma presunção de culpabilidade familiar solidária, o que ocasionava que famílias inteiras, despojadas, passassem a ter de viver da caridade, passando fome e privações. 

    Para o historiador Hermano Saraiva, o confisco das fortunas dos cristãos-novos foi objeto de "muito interesse", uma possível oportuna fonte de receita. Os cristãos-novos formavam, em maioria, uma classe média de capitalistas e mercadores, não sendo bem aceites nem pela pequena burguesia cristã-velha, nem pela nobreza.

 O primeiro auto de fé lusitano ocorreu em 26 de setembro de 1540. Os autos eram considerados a cerimônia máxima de representação do poder Inquisitorial. Realizados nos distritos-sede dos tribunais, contavam com presenças ilustres de figuras da nobreza, inclusive da família real.

    Para os que iam assistir era como um dia de festa, onde alguns levavam quitutes para comer enquanto assistiam as condenações. Todos os condenados eram obrigados a usar "hábito penitencial", também conhecido como sambenito. Essa roupa continha imagens de chamas de fogo cuja posição variava, sendo para cima no caso dos reconciliados e para baixo no caso dos relaxados. Os condenados caminhavam em procissão até a praça onde se realizaria o Auto e então esperavam por sua vez de subir no cadafalso para ouvir a sentença que lhe seria proferida e também proclamar seu arrependimento e abjurar dos costumes heréticos.

     De acordo com Henry Charles Lea,  entre 1540 e 1794, os tribunais de Lisboa, Porto, Coimbra e Évora queimaram 1.175 pessoas vivas, e queimaram a efígie de outras 633 e impuseram castigos a 29.590 pessoas. No entanto, a documentação de 15 dos 689 autos de fé desapareceu, de forma que estes números podem subestimar levemente a realidade. Também se ignora quantas vítimas morreram nos cárceres da Inquisição em resultado de doenças, falta de condições e maus tratos; as prisões poderiam prolongar-se por meses ou até anos aguardando a confirmação dos "crimes".

Embora extinta oficialmente em 31/03/1821 (mais de três séculos de perseguição, sendo o maior período se comparado com outros países), a Inquisição Portuguesa foi perdendo sua força durante a segunda metade do século XVIII. Foi em 25 de Maio de 1773, já em plena época das luzes, que Sebastião José de Carvalho e Melo, mais conhecido como Marquês de Pombal, primeiro-ministro de D. José I, promulgou uma lei que extinguiu as diferenças entre cristãos-velhos e cristãos-novos, tornando inválidos todos os decretos e leis anteriores que discriminam os conversos.

Foram queimadas as listas de cristãos-novos no Reino, aboliu a limpeza de sangue e passou a ser proibido usar a palavra “cristão-novo”, quer por escrito ou oralmente. As penas para quem usasse a expressão eram pesadas. A partir daí, os convertidos à força passaram a poder exercer todos os cargos e empregos públicos. A Inquisição transformou-se em tribunal de Estado, acabando com a perseguição da Igreja contra os convertidos.

Abaixo, caso tenha interesse, poderá assistir o vídeo sobre a história dos judeus em Portugal, com orientação e entrevista com a  historiadora Dra. Anita Novinsky. Este vídeo refaz o caminho dos judeus quando saíram da Espanha e foram à Portugal, em 1492. Vale a pena assistir!


Referência: 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Inquisi%C3%A7%C3%A3o_portuguesa#cite_note-FOOTNOTELea310-42

URL: http://www.museudainquisicao.org.br/artigos/a-chegada-dos-cristaos-novos-e-marranos-ao-brasil/

BOCACIOVAS, PÁG 134 cita: NOVINSKY. Anita. Inquisição: prisioneiros do Brasil. São Paulo: Ed. Expressão e Cultura, 2002. pp. 27-43.

ASSIS, Angelo Adriano Faria de (2006). «As "mulheres-rabi" e a Inquisição na colônia: narrativas de resistência judaica e criptojudaismo feminino - os Antunes, macabeus da Bahia (séculos XVI-XVII)». A Inquisição em Xeque: temas, controvérsias, estudos de caso. Rio de Janeiro: UERJ. págs. 180, 181, 182.

  Pieroni, Geraldo (1997). «Os excluídos do Reino: A Inquisição Portuguesa e o degredo para o Brasil-Colônia.». Textos de História. 5: 23-40. Consultado em 7 de junho de 2019.

 Saraiva, José Hermano (1986). História concisa de Portugal (10.a edição). [S.l.]: Publicações Europa-América.




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